sexta-feira, junho 30, 2006

Sem sinal de mim...

Acordo agitada, olho ao meu redor e por um segundo sinto que franzi o cenho. Nada me é familiar. A vista vai clareando e percebo ser o meu quarto esse ambiente assustador. Finjo uma calma criada por mim mesma.
- Cara, cadê as minhas coisas? - Me indago sem notar que a vida vazia que escolhi me levara até aquele ponto. Começo a buscar sinais de mim e as únicas coisas que me pareceram boas, estavam empacotadas no alto do meu armário. No auge do meu próprio desespero, corro para o telefone e algo como um chute atinge minhas costelas...No meio da dormência e formigamento, cambaleei de susto. Não havia ninguém para ligar. Essa constatação me deixou imóvel e engoli meu cuspe a custo enquanto tentava lembrar de qualquer terremoto que pudesse ter me trazido para tão longe. Tento me lembrar de nomes e de repente todas as minhas amizades passaram voando por mim e consigo me lembrar apenas do pique-se-esconde na rua quando eu tinha por volta de 12 anos. Era um passado relativamente longe. Estatelei-me no chão do quarto. Estava frio, gelado. Fui me encolhendo e juntando cada pedacinho meu que parecia distante. Quando cheguei no limite da minha elasticidade, explodi. O choro veio devagar, o caminho percorrido pelas lágrimas aquecia meu rosto. Eu curtia toda essa fossa, e senti pena de mim. REPITO: pena. Como posso ter chegado a esse ponto?
Onde estava a eu da qual me orgulhava cegamente?
Aquela menina surpreendentemente viva, havia ido pra onde?
Era como se eu me visse de fora. E não gostasse do que via.
Todo esse conflito tinha me deixado cansada...Cada micromolécula do meu corpo se sentia extremamente cansada...Eu precisava de uma injeção de vida. Precisava sair daqui, precisava ir para qualquer lugar. Eu precisava de QUALQUER COISA. Como as lágrimas não cessavam, resolvi caminhar vagarosamente até o rádio. Sabe quando você pula e berra com uma música e sente como se você se desinflasse e de 55kg passasse a pesar 10kg? A minha idéia para esparecer era justamente essa. Plic! Apertei o play, a esperança dava cambalhotas no meue stômago. (talvez fosse a fome) Constato que talvez fosse mesmo a fome já prevendo meu fracasso. O que tocava no rádio era Los Hermanos. Praguejei em meio a dor que mais uma vez me consumia. Um ódio latente pulsava dentro de mim enquanto percebia minha janela sem grades...Não sentia vontade alguma a não ser a de pular rumo ao desconhecido.
Fora de mim, qualquer coisa tinha chance de ser feliz - pensei.
Foi quando me veio a figura de meus pais à cabeça. Não importava a eles que eu tivesse desistido dos meus sonhos, não importava que eu fosse odiosa e fracassada. Sempre haveria excesso de carinho para suprir meu excesso de carência. Subi a escada tropeçando em todos os degraus. Estava esbaforida como alguém que ansiava o primeiro lugar de uma importante maratona. Era minha única salvação, constatava enquanto corria.
Chegando lá, ganhei um abraço carinhoso digno de um sorriso. Era o primeiro do meu dia. Meu pai colocou-me sentada a mesa e ofereceu-me leite. Ele me amava, eu me senti linda e as peças do meu quebra-cabeça haviam sido catadas do chão. Estavam jogadas na mesa, e cabia a mim montá-lo. Me recompus e lembrei que não era só no mundo. Sorri o segundo sorriso, mas estava ciente de que ainda estavam faltando muitas mudanças para que eu voltasse a ME ser. Me pareceu que eu tinha todo tempo do mundo, afinal, eu faria 18 anos naquele mesmo mês. Inflei o peito de ar e comecei a juntar coragem para tomar 1001 atitudes.

Railane Borges