sexta-feira, dezembro 15, 2017

Um peixe que pedala

Um Ilusionista na cama
Dói mais que um espelho quebrado
Cravado na carne da mão

É dia que vira noite
Que vira mês que vira pra sempre

E um vazio desonesto
Rouba a reputação sem dó
Nem cabimento

Quando pagar para ver
É amargo e sombrio como as suas farsas
A dor no peito vira só coração
Gritando denúncia de mentira à vista.
Marinheiro que brinca com o (a)mar
Põe a alma à deriva



Novembro 2017

segunda-feira, agosto 14, 2017


                               Ausência



Como se o corpo estivesse sem um pé. Como se faltasse alguma coisa que impedisse as outras de funcionar. Liquidificador sem lâmina e as frutas girando e nada. As sombras do trânsito passando aquele filme na janela. E só. Podiam ir-se minutos, ou horas, e todos escorriam pelo vão da indiferença. Um choque seguido de anestesia. E o corpo estirado, inerte. Baqueado, mas sem dor. Os olhos fechados. Nenhuma gota de sangue, à parte aquele cheiro de queimado subindo pelos ares e invadindo as frestas das cortinas velhas daquelas ruas abandonadas por Deus e pelo Diabo. Olhava os dedos das mãos pra saber a quem pertenciam aquelas linhas tortas. E os afagos de que era capaz. A quem? Pensava lento. Quase não saía ar. Pensar é respirar. Mas pensar lento nem sempre era pensar leve. Ali não era. Ali era denso. No fim deu-se conta de que não importava a quem pertenciam os caminhos, se não pudesse sair dali com o corpo por inteiro. E não podia. Não sairia dali. Era assunto fechado a sete chaves. Esperaria que a terra se abrisse e carinhosamente envolvesse seu corpo esquálido em seu manto frio e fértil, para que nunca mais tivesse que se lembrar dos seus olhos brilhantes. De sua voz embargada. Da sua energia explosiva. Dos seus gestos e palavras, e de toda a dureza que consumia lentamente sua alma. Havia lembranças que furavam o acordo do tempo de levar tudo embora antes que você pudesse morrer de uma tristeza tão exata. Olhava-se e detestava tudo que via. Não queria mais se ver, ao menos até que a campainha tocasse e o carteiro aparecesse e com suas mãos quentes entregasse alguma correspondência fria e mecânica, ou algum de seus amigos tentasse enviar uma mensagem qualquer via aplicativo do enfadonho e solitário universo virtual de redes sociais.Uma mensagem que não se pudesse recusar a responder, talvez. Quanto tempo poderia ficar ali sem levantar suspeitas, até que fosse estranho estar vivendo em uma terra distante onde a língua do seu coração não pudesse ser compreendida por nenhum outro habitante e o limite do mundo estivesse ao alcance da porta? Quanto tempo até mais uma vez ter de carregar além fronteiras aquele emaranhado incompreensível de sentimentos turvos onde se afogava lentamente sua sanidade?